sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Greve dos bancários, sem os sub-bancários...

Excelente texto que analisa a situação das greves no sistema financeiro atual, além de fazer referências à nobre ministra Eliana Calmon. Leiam com atenção, pois traz informações interessantes:

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Inteligência dos bancos e a greve dos que sobraram

A grande alteração promovida no setor bancário brasileiro nos últimos anos ajuda a entender o porquê da greve dos bancários, nos dias de hoje, não ter mais grande repercussão social, não servir propriamente como um mecanismo de pressão contra a categoria econômica, e o porquê de infelizmente, uma classe de trabalhadores comprometidos e que participam efetivamente do grande processo de diversificação e de elevação de lucratividade destas empresas financeiras, estarem cada vez mais distantes do rendimento obtido, maior a cada dia.

O texto será curto e não nos empenharemos em analisar o contexto histórico da criação do nosso mercado financeiro, nem tão pouco as agruras capitalistas da lastimável divisão de renda que ainda impera nestes rincões, sendo que o que importa aqui é a situação atual, patentemente não gerada apenas por um movimento de evolução tecnológica combinada com a readequação de pesos e importâncias entre os setores da economia, mas que além disso tudo e talvez preponderantemente, houve no caso do setor bancário uma atuação voluntária e altamente especializada, de uso de inteligência e técnicas de racionalização que, sem causar impactos abruptos, levaram sua estrutura a se tornar cada vez mais lucrativa a medida que a mão de obra tornou-se cada vez mais dispensável e/ou fracionada/dividida.

Bem assim que, no quesito terceirização de mão de obra, por exemplo, em alguns anos, aquela forma que se iniciou com movimentos de contratação de empresas para fornecimento de alguns operários para compensação bancária, cadastro de dados e documentos, call center etc, transformou-se em algo que não representa mais, em nenhum aspecto, uma terceirização apenas de mão de obra.

Hoje temos que a maioria dos serviços dos bancos, como um todo, é terceirizada. São feitos nas lotéricas, nos correios, nos caixas eletrônicos que estão nos supermercados e farmácias ou postos de gasolina. Os funcionários que atendem os serviços bancários nos correios e nas lotéricas e em correspondentes diversos não são mais bancários, não ganham sequer o piso dos bancários, não tem a garantia da mesma jornada etc. Os bancos assim não têm mais funcionários terceirizados. Não tem porque não fazem mais os seus próprios serviços, que são feitos agora por outras empresas, que são mal remuneradas e remuneram mal seus empregados. Estes empregados têm menos força que os bancários, que também agora são em muito menor numero e assim mais fracos no conjunto.

E outros serviços bancários são feitos por agências seguradoras, casas de câmbio, agências de viagem, financiadoras, agências de crediário, lojas de varejo, tudo a preço muito mais em conta. E tudo por salários muito mais módicos. Atrás da chamada popularização dos serviços bancários, está uma tremenda elevação de lucros a partir de uma grande economia de custos.

E vejam como dinheiro gera dinheiro. Nos bancos deve haver segurança. Nos correios não precisa. Nas lotéricas não precisa também. Quem vai ser baleado mesmo são os donos ou funcionários destas pequenas agências. Então terceirizaram os assaltos também. Atualmente há muito mais assaltos de lotéricas que de bancos. Nos caixas eletrônicos e 24 horas não colocam segurança também, apesar de provavelmente ser devido. Inteligência, assim, gera inteligência também.

Esses dias fomos almoçar e aproveitei para tirar dinheiro em um ATM que estava pelo caminho, dentro de um mercado. Na tela ele mostrava umas notas rasgadas e cor de rosa enquanto o meu dinheiro saía, e um aviso grafado me dizia: "se o dinheiro estiver com tinta ou rasgado, devolva". Mas devolver para quem? Não tem nenhum funcionário. A máquina não abre para eu enfiar o dinheiro de novo. Inteligência, talvez, é saber que o seu cliente é impotente. E sua mão de obra também o é.

Bom, e tem outra terceirização, além desta manobra já relatada. A outra parte da terceirização é para o próprio cliente. Grande parte do serviço que o bancário fazia tempos atrás quem faz hoje em dia é o cliente. Ou seja, o banco terceirizou grande parte do serviço para o próprio cliente. Para mim e para você, e ainda cobra por isso. E além de terceirizar o serviço para o próprio cliente, o que é cada vez mais incentivado (logicamente pela economia que isso gera), parte do risco dos negócios também é transferido ao cliente, ou seja, se algo der errado em suas transações "via bank line" e seu dinheiro se desvirtuar por aí, não pense que o banco vai correr para assumir o prejuízo. Isso será muito pouco crível.

Então, sobrou muito pouco para que os últimos bancários que sobraram façam nos bancos. E o mais estranho é isso. Os serviços financeiros multiplicaram "n" vezes nos últimos anos. Os lucros nem se comente. E na outra ponta os bancários são em contingente cada vez menor. Apesar de que o que surgiu de postos de trabalho em lotéricas, correios e derivados não foi brincadeira. E tristemente, com condições de trabalho muito piores. São os "sub-bancários", uma nova espécie com tarefas equivalentes e remuneração ainda bem pior. E sem falar no meu "emprego bancário". Todo dia, como cliente, trabalho um pouquinho e ainda pago umas taxas. Olha, digo que inteligência assim pode chegar a dar até uma certa inveja.

E destes que são bancários hoje, e que poderiam ser em numero dez ou vinte vezes maior, a grande maioria é gerente. É impressionante como quase todo mundo que trabalha em banco hoje é gerente. Até o rapaz do elevador vai ver que é "gerente de elevadoria". A copeira é gerente de copa. E aí vai. Uma técnica elaborada para driblar a jornada de seis horas e as horas extras em geral.

Sem falar que este tanto de gerente deve atrapalhar as greves da categoria. Afinal de contas, pelo menos os de verdade, não são profissionais que costumam aderir a greves. Então, os que são gerentes só de nome devem ficar numa tremenda dúvida. Um problemão.

E por falar em greve, como está difícil fazer greve no Brasil. Apesar de existir o direito à parede, com lei própria e tudo, os tribunais, que no Brasil interferem nestas relações por conta do ainda sobrevivente direito normativo, estão cada vez mais contrários a tais movimentos.

Existe uma certa intolerância ao direito de greve atualmente. As manifestações não são aceitas e o direito é muitas vezes ignorado. Parece que a greve, atualmente, só é efetivamente possível no serviço público. Lá, pelo menos, ainda que as reivindicações não sejam atendidas, o pessoal tira uma folga e recebe normalmente os dias parados. Pelo menos até hoje as ameaças de corte de ponto já realizadas nunca foram cumpridas, não que saibamos. Ouvi alguns dizerem que folga remunerada também é bom, apesar de não trazer nenhuma dignidade e não resolver o problema dos que realmente se envolvem na questão coletiva.

E nunca vou esquecer do dia em que sentamos na mesa de negociação em 2008, no TRT aqui em SP, assessorando juridicamente uma grande categoria profissional em greve, com mediação da saudosa desembargadora Cátia Lungov, que antes de analisar um pedido de liminar para que parte da categoria voltasse ao trabalho, apesar da atividade não estar elencada na lei como essencial, deu a palavra a ilustre procuradora do Trabalho presente, que opinou no sentido de que a ordem fosse dada para que o mínimo de 90% da categoria voltasse imediatamente ao trabalho.

Aquele parecer exarado oralmente pela representante do MPT foi tão inusitado, que tanto nós quanto os representantes da categoria econômica acabamos sorrindo e dizendo que 90% de frequência não ocorria sequer nos dias normais de trabalho. Logicamente que o desfecho foi digno da capacidade e da competência da mediadora já citada.

Bom, de toda a inteligência do setor econômico dos bancos já falamos, e de resto nem precisávamos falar, que em um sistema capitalista esperto é quem ganha muito. A pena é que, infelizmente, por um e por todos os motivos, parece a greve não conseguir ser mais meio tão eficaz para se conseguir pressionar o setor econômico. Não neste cenário que temos.

Talvez se viessem os outros bancários que não são considerados bancários – aqueles "sub-bancários." Talvez se viessem os clientes que são um pouco bancários. Talvez se o direito de greve realmente existisse. Talvez se as partes pudessem se entender sem interferências, como ocorre em diversos países, especialmente os mais desenvolvidos. Talvez...

Bom, aproveitando que estou escrevendo isso aqui e mudando totalmente de assunto, gostaria muito de elogiar as atitudes da ministra Eliana Calmon. Mas sei que ela não precisa que eu fique aqui contando todas as suas virtudes, que já são conhecidas, assim como são de longe conhecidas sua ampla capacidade e competência, e o compromisso com os jurisdicionados. Tenho uma filha de seis anos que adora andar por aí de fantasias, de princesas diversas e mulher maravilha e que vive me pedindo para me fantasiar também. Sei que vestir a fantasia de alguém, para minha menina, é uma forma de homenagem, pois na realidade ela está ali tentando parecer ou mesmo se transformar naquele personagem. Então, aproveitando esta ótima oportunidade, pergunto aos que se aventuraram a ler este textinho até o final, se sabem onde posso encontrar uma fantasia da Eliana Calmon para comprar ou alugar. Essa fantasia eu admito que vestiria com orgulho, e sairia por aí junto da minha adorada filhota, em aventuras mil. Mas, se me permite a ministra, somente acrescentaria uma capa, no meu caso da cor azul.


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* Mauro Tavares Cerdeira é economista e advogado sócio do escritório Cerdeira Chohfi Advogados e Consultores Legais, consultor na área coletiva e sindical e conferencista.


Fonte: Informativo eletrônico Migalhas

Mais apoio à Ministra Calmon

Mais uma instituição demonstra seu apoio à nobre Ministra Eliana Calmon:

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OFÍCIO Nº 020/11-FENADEPOL
Brasília/DF, 29 de setembro de 2011
À Sua
Excelência ELIANA CALMON
Ministra do Superior Tribunal de Justiça
Brasília – DF
Senhora Ministra,
A FEDERAÇÃO NACIONAL DOS DELEGADOS DE POLÍCIA FEDERAL – 
FENADEPOL, entidade sindical representativa da categoria dos 
Delegados de Polícia Federal, vem respeitosamente expressar a 
Vossa Excelência irrestrita solidariedade, em face sua intransigente 
defesa da ética e da Justiça, na verdadeira acepção da palavra, e de 
sua luta sem trégua contra a impunidade e a corrupção e por um 
Poder Judiciário mais imparcial e presente.
Os Delegados de Polícia Federal, com muito orgulho, na qualidade
de membros do sistema de persecução criminal, e partícipes da luta 
por um Brasil mais justo e democrático, parabenizam e enaltecem 
Vossa Excelência, por levar ao conhecimento público a real 
situação da Justiça brasileira, nesse momento que tem sido 
alvo de estranhas e incompreensíveis pressões.
Respeitosamente,
ANTONIO BARBOSA GOIS
Delegado de Polícia Federal
Presidente

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Desagravo ao desagravo

A Ministra Eliana Calmon merece o apoio de TODA a sociedade. Reproduzo texto do informativo eletrônico Migalhas:


Desagravo ao desagravo

"À caça dos bandidos. Bravo Corregedora ! 

A divergência manifestada pelo ministro Peluso sobre as declarações da ministra Eliana Calmon quando diz da existência de bandidos escondidos nas togas da Justiça parece de todo equivocada. 

Por primeiro, a ministra é Corregedora, de modo que lhe cumpre mesmo vasculhar os quadros da Magistratura procurando por bandidos, que certamente nela estão. Melhor do que ninguém, deve a ministra conhecê-los e pelo trabalho que faz certamente já os conhece. 

Ademais, eles existem mesmo, todos têm certeza disso. A afirmação da ministra, de outro lado, não ofende a magistratura, porque, em se sabendo dos bandidos, há de se tratar de expulsá-los, exatamente para que se afaste a mácula que, não atacada, acaba disseminando-se pela Justiça como um todo, comprometendo-a mais do que atualmente a compromete. 

É certo que a magistratura é composta, no Brasil, de pessoas dedicadas e honestas : esse é o seu perfil e sua marca distintiva, sem qualquer margem de dúvidas. 

Todavia, não está livre dos que nela se escondem e são esses que precisam ser denunciados, procurados e extirpados. A melhor forma de se ressaltar a qualidade de uma instituição é a atuação dela própria afastando aqueles que não a merecem, por isso não se pode e muito menos se deve colocar em dúvida quem se propõe a fazer, com coragem e determinação, esse trabalho de profilaxia." 

Clito Fornaciari Júnior - escritório Clito Fornaciari Júnior - Advocacia

Retrato de um Supremo Tribunal Federal

Para quem não conhece o STF e o Ministro Peluso:


Um poder de costas para o país
MARCO ANTONIO VILLA

Justiça no Brasil vai mal, muito mal. Porém, de acordo com o relatório de atividades do Supremo Tribunal Federal de 2010, tudo vai muito bem. Nas 80 páginas — parte delas em branco — recheadas de fotografias (como uma revista de consultório médico), gráficos coloridos e frases vazias, o leitor fica com a impressão que o STF é um exemplo de eficiência, presteza e defesa da cidadania. Neste terreno de enganos, ficamos sabendo que um dos gabinetes (que tem milhares de processos parados, aguardando encaminhamento) recebeu “pela excelência dos serviços prestados” o certificado ISO 9001. E há até informações futebolísticas: o relatório informa que o ministro Marco Aurélio é flamenguista.

A leitura do documento é chocante. Descreve até uma diplomacia judiciária para justificar os passeios dos ministros à Europa e aos Estados Unidos. Ou, como prefere o relatório, as viagens possibilitaram “uma proveitosa troca de opiniões sobre o trabalho cotidiano.” Custosas, muito custosas, estas trocas de opiniões. Pena que a diplomacia judiciária não é exercida internamente. Pena. Basta citar o assassinato da juíza Patrícia Acioli, de São Gonçalo. Nenhum ministro do STF, muito menos o seu presidente, foi ao velório ou ao enterro. Sequer foi feita uma declaração formal em nome da instituição. Nada.

Silêncio absoluto. Por que? E a triste ironia: a juíza foi assassinada em 11 de agosto, data comemorativa do nascimento dos cursos jurídicos no Brasil. Mas, se o STF se omitiu sobre o cruel assassinato da juíza, o mesmo não o fez quando o assunto foi o aumento salarial do Judiciário. Seu presidente, Cézar Peluso, ocupou seu tempo nas últimas semanas defendendo — como um líder sindical de toga — o abusivo aumento salarial para o Judiciário Federal. Considera ético e moral coagir o Executivo a aumentar as despesas em R$ 8,3 bilhões. A proposta do aumento salarial é um escárnio.

É um prêmio à paralisia do STF, onde processos chegam a permanecer décadas sem qualquer decisão. A lentidão decisória do Supremo não pode ser imputada à falta de funcionários. De acordo com os dados disponibilizados, o tribunal tem 1.096 cargos efetivos e mais 578 cargos comissionados. Portanto, são 1.674 funcionários, isto somente para um tribunal com 11 juízes. Mas, também de acordo com dados fornecidos pelo próprio STF, 1.148 postos de trabalho são terceirizados, perfazendo um total de 2.822 funcionários. Assim, o tribunal tem a incrível média de 256 funcionários por ministro.

Ficam no ar várias perguntas: como abrigar os quase 3 mil funcionários no prédio-sede e nos anexos? Cabe todo mundo? Ou será preciso aumentar os salários com algum adicional de insalubridade? Causa estupor o número de seguranças entre os funcionários terceirizados. São 435! O leitor não se enganou: são 435. Nem na Casa Branca tem tanto segurança. Será que o STF está sendo ameaçado e não sabemos? Parte destes abuso é que não falta naquela Corte. Só de assistência médica e odontológica o tribunal gastou em 2010, R$ 16 milhões.

O orçamento total do STF foi de R$ 518 milhões, dos quais R$ 315 milhões somente para o pagamento de salários. Falando em relatório, chama a atenção o número de fotografias onde está presente Cézar Peluso. No momento da leitura recordei o comentário de Nélson Rodrigues sobre Pedro Bloch. O motivo foi uma entrevista para a revista “Manchete”. O maior teatrólogo brasileiro ironizou o colega: “Ninguém ama tanto Pedro Bloch como o próprio Pedro Bloch.”

Peluso é o Bloch da vez. Deve gostar muito de si mesmo. São 12 fotos, parte delas de página inteira. Os outros ministros aparecem em uma ou duas fotos. Ele, não. Reservou para si uma dúzia de fotos, a última cercado por crianças. A egolatria chega ao ponto de, ao apresentar a página do STF na intranet, também ter reproduzida uma foto sua acompanhada de uma frase (irônica?) destacando que o “a experiência do Judiciário brasileiro tem importância mundial”. No relatório já citado, o ministro Peluso escreveu algumas linhas, logo na introdução, explicando a importância das atividades do tribunal.

E concluiu, numa linguagem confusa, que “a sociedade confia na Corte Suprema de seu País. Fazer melhor, a cada dia, ainda que em pequenos mas significativos passos, é nossa responsabilidade, nosso dever e nosso empenho permanente”. Se Bussunda estivesse vivo poderia retrucar com aquele bordão inesquecível: “Fala sério, ministro!” As mazelas do STF têm raízes na crise das instituições da jovem democracia brasileira. Se os três Poderes da República têm sérios problemas de funcionamento, é inegável que o Judiciário é o pior deles. E deveria ser o mais importante. Ninguém entende o seu funcionamento.

É lento e caro. Seus membros buscam privilégios, e não a austeridade. Confundem independência entre os poderes com autonomia para fazer o que bem entendem. Estão de costas para o país. No fundo, desprezam as insistentes cobranças por justiça. Consideram uma intromissão.

MARCO ANTONIO VILLA é historiador e professor da Universidade Federal de São Carlos.